Ano da publicação: 2010
ONGS – Instrumento de Gestão Ambiental
Introdução
Correta é a afirmação de que a sociedade civil é tripolar, no sentido de que há três forças em ação: a iniciativa privada empresas), o governo e as ONGS, o que demonstra a importância destas.
As ONGS já foram chamadas de “A Nova Esquerda do Brasil”, ou a “verdadeira oposição”, e também de “Inimigas do Capitalismo” (entre outros por Felipe Seibel e Tatiana Gianini, da Revista Exame), pela liberdade, coragem e iniciativa que têm de enfrentar governo e toda sociedade, na defesa dos interesses para os quais foram criadas, notadamente interesses sócio-ambientais.
Problema que não será abordado analiticamente neste trabalho, pois que demais complexo – o que demandaria espaço próprio – mas que tem de ser citado, é o das ONGS de fachada, utilizadas na defesa de interesses escusos, como o da “internacionalização da Amazônia” e usurpação de nossa riqueza.
Andréa Rabinovici faz interessante estudo intitulado “Ongs Transnacionais na Amazônia Brasileira, Divergência entre Militantes e Militares”, no qual resume todos os interesses em jogo, no que diz com a proposta, totalmente atual e necessária de “defesa do verde”, e do perigo também real das ONGS que defendem interesses estrangeiros, baseados nas teorias de internacionalização dos chamados “bens públicos” (global commons).
Como já devidamente rechaçado por INDIRA GANDHI, a pretensão dos países ricos de que não façam os demais o que eles fizeram para crescer, tem de ser respondido de que não há maior problema ambiental do que a miséria e a pobreza, razão pela qual fez bem nosso presidente Lula, em discurso, ao mandar que tais ONGS plantem árvores em seus países de origem. Esta atuação, por vezes silenciosa, das ONGS que defendem interesses estrangeiros fez surgir neologismos como “máfia verde”, “neocolonialismo verde”, e juntamente com “ocupação silenciosa” e “interesses ocultos” são expressões recorrentes nas publicações que tratam do tema.
Assim, desde a utilização de questões ambientais como “barreiras comerciais” para impedir o livre comércio de nossos produtos, à atual questão da “internacionalização da Amazônia”, que desde 1980 vem ganhando fôlego, há de mister avaliar bem o que motiva as ONGS, antes de, por “modismo” se aderir a este ou aquele protesto.
Por outro lado, o que é certo é certo mesmo que só uma pessoa o faça e o errado é errado mesmo que todos o façam, razão pela qual na maioria dos casos, a causa da “preservação ambiental” é bem fundamentada, porquanto é inegável o esgotamento dos recursos naturais e o nível alarmante de poluição a que globalmente chegamos. Poluição esta que em grande parte é cometida de maneira dolosa, consciente, por empresas que cometem crimes ambientais, do que se pode ter ideia no trabalho do GREENSPEACE, publicado em junho de 2002, intitulado “Crimes Ambientais Corporativos no Brasil”.
No mundo inteiro, também, há casos onde a riqueza, que poderia ser utilizada na fomentação de práticas sustentáveis (energias renováveis: solar, eólica etc.), preconizadas entre outras pela Agenda 21, são utilizadas para alimentar o sistema que levará o mundo a colapso próximo, como é o caso de DUBAI, considerada modelo da Las Vegas americana, uma ode ao consumismo e a ao princípio de que se deve fazer de tudo para “preservar nosso povo”, mesmo com o sofrimento e morte dos demais seres que habitam o mundo . Os níveis de salinidade no Golfo pela produção de água potável por dessalinização, a poluição desenfreada e outros problemas que se apresentam em Dubai, demonstram que a preocupação em se ter o maior prédio do mundo e outros símbolos do nosso “mundo moderno” é feita não de maneira harmoniosa com o meio-ambiente, mas sim com aniquilar a dignidade da pessoa humana, com condenar inúmeros seres à miséria, fome e destruição (o modelo de vida ali se adotado mundialmente somente será possível de se manter houver e 3 a 5 planetas Terra para lhes fornecer os recursos naturais).
Algumas ONgs são denunciadas sob a acusação de atuarem justamente a proteger os interesses ocultos e contraditórios de algumas empresas, tal como se pode ver na reportagem que denuncia a atuação de ONG The Nature Conservancy que, segundo a reportagem publicada no e-jornal O Impacto, protegeria a Cargill, empresa que supostamente seria responsável pelo desmatamento e destruição de sítios arqueológicos, a extinção da única praia urbana da cidade de Santarém e a poluição do Rio Tapajós.
Entre inúmeras ONGS que poderíamos analisar, com as ressalvas acima feitas quanto aos “interesses ocultos e financiados por capital estrangeiro” de algumas, analisaremos a atuação da S.O.S.MATA ATLÂNTICA, por ser das que melhor apresenta as possibilidades de adesão das empresas ao selo “verde”, ou de simpatizantes da causa ecológica.
Justificativa
A Fundação SOS Mata Atlântica é uma ONG-Organização Não-governamental, sem fins lucrativos, que tem por missão promover a conservação da diversidade biológica e cultural do Bioma Mata Atlântica e ecossistemas sob sua influência.
Criada em 1986, desenvolve atividades que estimulem o desenvolvimento sustentável, educação e o conhecimento sobre a Mata Atlântica, e desenvolve projetos de conservação ambiental, produção de dados, mapeamento e monitoramento da cobertura florestal do Bioma, campanhas, estratégias de ação na área de políticas públicas, programas de educação ambiental e restauração florestal, voluntariado, desenvolvimento sustentável e proteção e manejo de ecossistemas, tal como anuncia em seu sítio.
Parcerias com o Bradesco, com a Colgate-Palmolive, Grupo Abril e outras empresas (arroladas em extenso lista de doadores no sítio da Fundação) permitem arrecadar recursos que permitam o atingimento de seus objetivos sociais, além de promover o engajamento de conhecidas empresas na “causa verde”.
Desenvolvimento
São inúmeros os projetos desenvolvidos pela FUNDAÇÃO S.O.S.MATA ATLÂNTICA, desde seminários, passando pela criação e publicação do primeiro Atlas dos Remanescentes Florestais e Ecossistemas Associados da Mata Atlântica em 1990 (que tem o patrocínio do Cartâo de Crédito do Bradesco), à plantação de mais de 60.000 mudas de árvores (Projeto Click árvore, em parceria com o Grupo Abril) nativas que hoje já forma bosques; e de 80.000 no projeto Floresta do Futuro; passando por projetos de despoluição do Rio Tietê, monitoramento de água do Rio Ribeira e outros de elevado cunho ambiental, a Fundação S.O.S. Mata Atlântica têm lugar de destaque entre as ONGS brasileiras.
Das alianças com empresas, que tornaram possível as realizações dos projetos, o sítio da Fundação S.O.S. Mata Atlântica destaca o patrocínio de alguns projetos pelo Bradesco, pela Colgate-Palmolive e pelo Grupo Abril:
“Hoje, a Fundação tem seus projetos patrocinados em grande parte pela base de cartões de crédito Bradesco Visa / SOS Mata Atlântica com cerca de 100 mil filiados (por meio da taxa de anuidade do cartão) que possibilitam a manutenção da estrutura, equipe de técnicos e profissionais da ONG.
E, se de um lado, as parcerias revertem numa perspectiva de sucesso para a Mata Atlântica, de outro colocam-se como uma oportunidade de inclusão da temática ambiental junto a funcionários e colaboradores das empresas. São elas que apostam, por exemplo, na capacitação de voluntários internos para palestras em escolas, na instalação de viveiros em suas unidades produtivas e na formação da consciência ambiental entre públicos cada vez mais amplos.
Aqui você conhece alguns casos emblemáticos de parcerias bem-sucedidas entre a SOS Mata Atlântica e o segundo setor.
Bradesco
O Bradesco está presente como principal apoiador dos projetos e iniciativas da SOS Mata Atlântica desde os primeiros anos de vida da entidade, ainda em 1989. A história de sucesso entre as duas instituições começa com a 1a edição do Atlas da Mata Atlântica, que logo despertou a direção da empresa para a gravidade da degradação do bioma.
Além do patrocínio direto, a vontade em apoiar a causa da Fundação originou a campanha de cartões de crédito Bradesco Visa / SOS Mata Atlântica, em que uma parcela da anuidade do cartão é destinada aos trabalhos da ONG, colocando-se também como uma estratégia de filiação à entidade. O crescimento foi vertiginoso: em menos de uma década, entre o lançamento do cartão em 1993 e o ano de 2003, a base de usuários passou de 2 mil para 96 mil. Boa parte dos 100 mil filiados da ONG provém hoje dessa parceria que, junto com o percentual do cartão de afinidade, garante o orçamento para os mais importantes projetos da Fundação.
A certeza em poder contribuir com a Mata Atlântica, envolvendo funcionários e clientes, fez o Bradesco dar mais um passo em 2004. Neste ano, foi lançado o título de capitalização Pé Quente Bradesco SOS Mata Atlântica, em que a meta inicial de venda de 10 mil títulos passou a 500 mil títulos em pouco mais de um ano. Isso equivaleu a 8 milhões de mudas de árvores nativas doadas para o programa Clickarvore.
Do lado da empresa, foram abertas as portas da Fundação Bradesco para a conscientização ambiental direta de alunos e professores. Pela instalação de viveiros educativos (atualmente em cinco unidades, com projeção de 24 viveiros em todas as unidades da Mata Atlântica), crianças e jovens aprendem a conhecer as árvores, a importância do meio ambiente e realizam oficinas e palestras em escolas.
O apoio do Bradesco contribui com os seguintes projetos da Fundação SOS Mata Atlântica: Atlas dos Remanescentes Florestais, Atlas dos Municípios, Clickarvore, Florestas Futuro, Projeto Meu Mundo de Educação Ambiental, Plantando Cidadania, Plataforma Ambiental, Observatório Parlamentar, Viva a Mata, Programa de Incentivo às RPPNs e Prêmio de Reportagem sobre a Biodiversidade da Mata Atlântica.
Colgate-Palmolive
O apoio da Colgate-Palmolive à causa da Fundação SOS Mata Atlântica poderia estar voltado só ao financiamento de projetos ambientais, mas a empresa alargou os horizontes da parceria com o terceiro setor e inovou ao lançar a linha Sorriso Herbal, com parte da receita das vendas revertidas para a entidade. A mensagem está na embalagem: o consumidor leva o creme dental e, junto, explicações sobre o funcionamento dos ecossistemas da Mata Atlântica.
Antes Kolynos do Brasil, quando foi incorporada à Colgate-Palmolive em 2003, a empresa que fabrica quase 2 bilhões de produtos por ano com 3 mil funcionários tem uma meta ambiciosa: levar conscientização ambiental para dentro da fábrica, atingindo seus funcionários.
O fruto desse comprometimento interno veio então em 2001, com a estruturação do ClubEco – o Clube da Ecologia da SOS Mata Atlântica – que com o passar dos anos foi ganhando novos elementos. Três viveiros nas fábricas produzem 5 mil mudas cada mas, mais do que as árvores, viram ferramenta educativa de funcionários, familiares e amigos. A capacitação contínua de cerca de 150 funcionários por voluntários da SOS Mata Atlântica faz proliferar a idéia da qualidade do meio ambiente onde se vive e se trabalha. Gerentes, funcionários do chão-de-fábrica e até diretores reproduzem em palestras o conhecimento adquirido.
Em sua tarefa principal, porém, o Clube da Ecologia vem atendendo crianças do ensino fundamental da rede pública, que participam de dinâmicas e atividades lúdicas, preparadas pelos funcionários-voluntários. Em 2005, alguns filhos de funcionários também fundaram o ClubEco do Futuro, para levar voluntários e seus filhos a reservas ecológicas, zoológicos e parques.
Na SOS Mata Atlântica, a Colgate-Palmolive tem permitido o desenvolvimento de projetos como: Atlas dos Remanescentes Florestais, Atlas dos Municípios, Programa Meu Mundo de Educação Ambiental, Centro Tuzino de Educação Ambiental e Difusão do Palmito, Plantando Cidadania, Viva a Mata, Prêmio de Reportagem sobre a Biodiversidade da Mata Atlântica, apoio à União pela Fauna da Mata Atlântica, além de viabilizar o Centro de Documentação e Informação.
Hotel Villa Rossa
Em outubro de 2005, a Fundação SOS Mata Atlântica lançou no Hotel Villa Rossa, em São Roque (SP), um projeto que promoveu o lançamento de uma aliança inédita entre a organização e o segundo setor. O hotel possibilitou a criação do ‘Espaço Florestas do Futuro’ e o reflorestamento de uma área com manancial do empreendimento. O objetivo da parceria tem sido envolver empresas de eventos, hóspedes de lazer e negócios em atividades de educação ambiental, e desenvolver ações que possam gerar, ao final de cada ano, 10 mil árvores para reflorestar as matas ciliares locais.
“Os próprios hóspedes, assim como as empresas que realizam eventos no hotel podem contribuir com o ‘Banco de Árvores Villa Rossa’. Basta que patrocinem uma determinada quantidade de mudas que serão plantadas nas margens dos rios para proteger e conservar a água. Se a idéia der certo, poderemos replicar o modelo em outros pontos onde os recursos hídricos estejam ameaçados”, explica Adauto Basílio, diretor de captação de recursos da Fundação.
Pela parceria com o Villa Rossa, todos os hóspedes recebem uma muda na chegada e são convidados a cuidar dela durante sua estada. Depois, podem plantá-la na área de reflorestamento do hotel ou levá-la para casa.
No ‘Espaço Florestas do Futuro’ haverá ainda um viveiro com árvores nativas da Mata Atlântica e painéis explicativos. Nele, serão desenvolvidas atividades de educação ambiental e oficinas para confecção de objetos com materiais recicláveis. Os monitores da equipe de lazer do hotel foram capacitados por técnicos da Fundação SOS Mata Atlântica e serão os orientadores ambientais durantes essas atividades.
Editora Três
Uma parceria pouco convencional entre a SOS Mata Atlântica e a Editora Três tem permitido a recuperação de trechos devastados da Mata Atlântica com a ajuda de assinantes das revistas Istoé, Gente, Planeta, Menu e Motor Show. Cada leitor que adere a campanha, filiando-se imediatamente ao projeto Florestas do Futuro Istoé, pode escolher uma árvore nativa que será plantada em seu nome na Fazenda Bulcão (MG). Ali, o fotógrafo Sebastião Salgado impulsiona um amplo programa de recuperação ambiental, com apoio de diversas instituições ambientais.
A empresa permite que o internauta participe desta iniciativa, clicando no site www.florestaistoe.com.br e escolhendo entre 160 espécies disponíveis. “O assinante também se torna sócio da SOS Mata Atlântica, recebe um cartão, camiseta, adesivo e boletins informativos”, explica Edgardo Zabala, diretor de assinaturas da Editora Três, que publica a IstoÉ.
A promoção é exclusiva aos assinantes, mas quem comprar o exemplar em banca não fica de fora. Parte do valor de capa é revertido à Fundação para custear as ações em prol da Floresta do Futuro ISTOÉ.
“Desde que nasce, até o dia em que morre, um ser humano consome 300 árvores, sem contar o combustível do seu carro”, calcula Mário Mantovani, diretor de mobilização da SOS Mata Atlântica. Ampliar a conscientização dos leitores, portanto, é outra possibilidade aberta por essa parceria com um veículo de comunicação. Assim, a Fundação passa a assinar a coluna ‘Sementes do Amanhã’, publicada semanalmente na revista Istoé, desde 2004.”
Por estes projetos acima mencionados e a fundamental participação das empresas, percebe-se que, com criatividade e boa vontade, fica dissolvido o antigo antagonismo iniciativa privada e ONGS AMBIENTALISTAS, porquanto a obrigatória conscientização social a que todos nos submetemos pelas leis sociológicas que ditam as transformações do mundo impõem o aparecimento de modelos em favor da vida, de um desenvolvimento sustentável que beneficie a todos.
Conclusão
O papel das ONGS ambientalistas, como stakeholders, diretamente relacionados às atividades produtivas (lato sensu) das empresas, e a liberdade com que atuam em defesa dos interesses para os quais foram criadas, é de subida relevância.
Fora as poucas ONGS de fachada, que defendem interesses ocultos até mesmo de empresas, como já amplamente divulgado na imprensa em casos emblemáticos, e outras que escondem sob a bandeira do movimento verde interesses políticos como o da “internacionalização da Amazônia”, é certo que as demais têm relevante função social.
Nesse contexto, Greenspeace, SOS MATA ATLÂNTICA e outras prestam relevantes serviços de conscientização e de luta por meio ambiente despoluído, já defendido por Norberto Bobbio na “Era dos Direitos”.
A Fundação S.O.S Mata Atlântica somente conseguiu implementar e desenvolver seus projetos mercê da ajuda que recebeu de empresas privadas, tais como Bradesco, Colgate-Palmolive, Editora Três etc., o que demonstra a importância destas no desenvolvimento de sociedade mais consciente, e de práticas alinhadas com a Agenda 21, que defendem o crescimento sustentável como única saída para o colapso mundial que se avizinha.
Miséria e fome, cuja eliminação deve estar dentro do conceito de crescimento sustentável – daí se falar em responsabilidades socioambientais, somente poderão ser erradicadas com aumento das parcerias, maior conscientização e, principalmente, pela continuidade do excelente trabalho feito pelas ONGS, denominadas de “a verdadeira esquerda”, “inimigas do capitalismo” e outras expressões que demonstram a liberdade e impetuosidade de seus projetos.
Rodrigo José de Kühl e Carvalho
Advogado no Rio de Janeiro e Brasília
Especialista em direito empresarial, com ênfase em societário e mercado de capitais, pela FGV-RJ,
Master of Law (L.L.M.) Litigation pela FGV-RJ; e
MBA em Direito Tributário, também pela Fundação Getúlio Vargas.
Referências bibliográficas
Seibel, Felipe e Gianini, Tatiana in http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0879/noticias/ongs-os-novos-inimigos-do-capitalismo-m0114488
Rabinovici, Andréa in http://www.anppas.org.br/encontro4/cd/ARQUIVOS/GT13-13-175-20080508210714.pdf
Crimes Ambientais Corporativos no Brasil in http://www.greenpeace.org.br/toxicos/pdf/corporate_crimes_port.pdf
Jornal O Impacto in http://www.oimpacto.com.br/meio-ambiente/ong-tenta-camuflar-acao-predadora-da-cargill/
SOS MATA ATLÂNTICA in http://www.sosmatatlantica.org.br/index.php?section=who&action=quemSomos